Resenha: O Construtor de Pontes – Markus Zusak

Estou assinando o clube de livros da editora Intrínseca, chamado Intrínsecos, desde outubro/2018, que foi o mês que o clube começou. Mas, por questões pessoais, ainda não li todos (tem sempre tanto livro na frente e aquela lista interminável de “livros para ler”…).

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Acontece que a Intrínseca caprichou mais que nunca no mês de dezembro/2018, e veio logo livro que quem? Do autor de A Menina que Roubava Livros, o escritor australiano Markus Zusak.

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Tudo bem, sei que teve muita gente que não curtiu A Menina que Roubava Livros, mas não foi o meu caso, que sofri de amores à primeira leitura, e li outra vez, com a mesma emoção da primeira, antes de assistir ao filme no cinema.

E, do mesmo modo que fiquei empolgada para reler o livro, também não aguentei de ansiedade para pular muitas leituras que eu queria fazer antes e parti direto para O Construtor de Pontes, o livro da caixa de dezembro/2018 do Intrínsecos.

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Sinopse:

“Cinco irmãos perdem a mãe e são abandonados pelo pai. Crescem juntos, cuidando uns dos outros, numa casa bagunçada no subúrbio de Sydney. Um deles narra a história de O construtor de pontes, novo romance do escritou australiano Markus Zusak.

Refugiada da Europa Oriental, Penélope Lesciuszko conhece Michael Dunbar, que assim como ela tem suas obsessões artísticas, e juntos eles têm cinco filhos: Matthew, Rory, Henry, Clayton e Thomas – os quais o leitor encontra, logo de cara, mergulhados numa atmosfera de caos e anarquia. “Falávamos palavrões que nem condenados, brigávamos feito cão e gato e travávamos batalhas épicas na sinuca ou pingue-pongue, nos dardos, no futebol, no baralho. Nossa TV estava cumprindo prisão perpétua. Nosso sofá pegou anos”, desabafa Matthew.

Cada irmão Dunbar tem uma particularidade: Matthew é o cara durão que toma conta de tudo; Rory é o mais bruto, tido pelos outros como invencível, “um rolo compressor humano”; Henry é fascinado por garimpar objetos em vendas de garagem e por ver filmes em casa; Clay, o protagonista, é o mais enigmático, sempre se preparando fisicamente para uma tarefa que parece não chegar nunca; e o mais novo Tommy, tem o hábito de levar para casa os mais improváveis animais de estimação.

O romance ganha fôlego logo no início, quando Michael retorna à casa dos filhos, como o Odisseu do poema grego. A essa altura, os filhos o renegam, e só um deles, Clay, se dispõe a ajudar o pai numa tarefa para a qual ele convocara a todos: construir uma ponte para atravessar um rio. Para isso, busca inspiração em Michelangelo e uma de suas obras mais instigantes. O construtor de pontes é uma história de amor entre irmãos, uma história de tempo entre pai e filhos, uma história de busca de identidade e de muita saudade, construída sobre os pilares firmes da imaginação de Markus Zusak.”


Minhas impressões sobre o livro: 

Vou começar fazendo um alerta principalmente àqueles que não gostaram de A Menina que Roubava Livros. Alguns elementos que o leitor encontrou naquele livro estão presentes também em O Construtor de Pontes, e eu diria até que de forma mais acentuada. Assim, pode ser que quem não gostou do primeiro justamente pelo que irei apontar adiante, encontre uma certa resistência para ler o novo romance de Zusak.

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O primeiro elemento que identifiquei em comum foi o narrador em terceira pessoa. Embora, nesse quesito, as semelhanças acabam por aí. Desta vez, a história é contada por Matthew, o irmão Dunbar mais velho, e não pela Morte. Se em A Menina que Roubava Livros a Morte era uma narradora onisciente devido, entre outros fatores, à sua soturna condição (a Morte tudo sabe), neste livro nos deparamos com a narrativa de uma história passada, que certamente beneficia Matthew com a ponderação e reflexão típicas do decurso temporal. Ele tudo parece saber ou porque teve a chance de parar e refletir melhor sobre acontecimentos passados ou porque narra os fatos passados à luz do conhecimento de algo que posteriormente lhe foi revelado de alguma forma, principalmente por Clay, nosso protagonista.

Além disso, Zusak  já havia demonstrado um certo gosto por frases curtas, e este é o segundo elemento comum. Em O Construtor de Pontes, porém, me parece que houve uma fixação por elas, que estão por toda parte: em meio a outras sentenças ou iniciando muitos parágrafos novos, numa tentativa nem sempre bem sucedida de se criar uma frase de efeito, impactante ou parágrafos com toques de poesia.

De modo geral, não vejo problema no uso de sentenças curtas; eu mesma sou uma grande fã delas, mas, até a primeira metade do livro, senti que a cadência da narrativa ficou um pouco prejudicada e cansativa. Mas, depois, que me acostumei com esse ritmo de pontuação mais constante, passei a ver a beleza da escrita. Creio que ela tem mais a ver com a personalidade de Matthew, o resoluto, que com um novo estilo a ser adotado por Zusak. Quem leu, qual sua opinião sobre isso?

Apesar do pequeno incômodo gerado pela narrativa um pouco truncada, não quer dizer que Zusak (ou Matthew) não tenha acertado em alguns momentos com a maestria e a genialidade que encontrei já em A Menina que Roubava Livros. Há sim trechos absolutamente lindos e tocantes, que fogem daquela fórmula abrupta que falei e têm muito mais poesia que os curtíssimos parágrafos que tentam fazer as vezes de versos:

“Menos de cinco minutos antes, ele dissera a si mesmo que não era nem filho nem irmão, mas ali, envolto nos últimos fiapos de luz e diante do que parecia a boca de um gigante, toda a sua pretensão em relação a si mesmo desapareceu. Pois como se vai até seu pai sem ser um filho? Como se deixa o próprio lar sem reconhecer de onde se vem? As perguntas o atropelaram rumo à outra margem do rio.”

E tem também o trecho lindo que vem no marcador de páginas:

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cartão postal, marcador de página, cartela de adesivos

“Querido Clay,

Quando você estiver lendo isto, já teremos conversado… Mas eu só queria dizer que sei que você vai partir muito em breve e que eu vou sentir saudade. Já estou com saudade.

Matthew me contou sobre um lugar remoto e uma ponte que você talvez vá construir. Tento imaginar do que essa ponte será feita, mas no fim das contas acho que isso não fará diferença.

Tenho certeza que uma coisa:

Essa ponte será feita de você

Com amor,

Carey”

Da metade em diante do livro, senti que algo se transformou dentro de mim mesma, e passei a lê-lo com outro sentimento, e fui ficando cada vez mais maravilhada com ele. É um livro para não se desistir. No fim, foi uma história grandiosa. Em O Construtor de Pontes somos expectadores de uma verdadeira Odisseia dos dias atuais, ansiando pelo retorno de um homem à sua família, e  assistindo a todos os dramas que entremeiam essa saga.

Particularmente, entre esses dramas, me agradou muito a personagem de Penny Dunbar (Penélope Dunar — minha personagem favorita), a qual foi muito bem construída e trabalhada por Zusak, e também ler a respeito do estranho modo pelo qual irmãos demonstram seu amor fraterno entre si. Veja bem, eu tenho dois irmãos homens, e embora tenha crescido também cercada por esse esquisito amor fraternal (muitas vezes demonstrado através de tapas e palavrões), só lendo este livro passei a entender melhor nossa própria relação e fiquei satisfeita de ver que nós sempre nos amamos à nossa maneira — ou à maneira deles.

Recomendo muito a leitura deste livro, assim que disponível para o público em geral, porque, afinal, todos temos e vivemos nossas próprias sagas familiares, com suas perdas, brigas, atritos, amor e atitudes por vezes incompreendidas, e é sempre bom ter uma perspectiva diferente, de fora, para refletirmos sobre nossas próprias famílias.


Minhas impressões sobre a caixa de dezembro (2018):

Todas as caixas dos Intrínsecos vêm, além do livro com capa dura personalizada, uma revistinha, com a sinopse do livro e demais conteúdos relacionados ao livro (bem bacana essas revistas), marcador de página e brindes temáticos também relativos ao livro.

Na caixa de dezembro, os brindes foram os mais lindos até o momento que escrevo este post. Veio uma cartela com adesivos dos inusitados animais de estimação que Tommy Dunbar, o caçula dos irmãos, adota: um gato, uma cachorra, (até aqui tudo bem), uma pomba e uma mula; um pin (broche) com uma máquina de escrever gravada nele; um bloquinho de papéis da papel pólen; enfeites de natal temáticos (livrinhos decorativos para pendurar na árvore de natal: Ilíada, Odisseia e O Construtor de Pontes; uma ecobag com a capa de A Menina que Roubava Livros, de um lado, e O Construtor de Pontes do outro, o marcador de páginas e um cartão postal.

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Pin temático
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Papéis da Papel Pólen
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Enfeite de Natal (Odisseia em destaque)
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Ecobag com estampa de A Menina que Roubava Livros

Na revista do mês, encontramos a sinopse, que coloquei lá em cima para vocês, bem como uma matéria sobre o autor, Markus Zusak, na qual descobrimos que a obra estava em produção há muitos anos (mais de 20 anos) e o resultado final é bem diferente de seu primeiro manuscrito; um artigo sobre Por que ler Odisseia, que é um livro que Penny Dunbar lia para seus cinco filhos – e eles adoravam! (mas realmente, acredito que é uma obra que vale a pena ler – e se você não estiver convencido, dê uma lida nesse artigo de Guilherme Gontijo Flores); curiosidades sobre algumas das obras de Michelangelo – já que o artista é recorrentemente citado em O Construtor de Pontes, inclusive vindo a se tornar um elemento da narrativa; um artigo sobre corrida, do Ricardo Lísias. Correr, aliás, é uma das ações que mais me faz identificar com Clay Dunbar. Eu adoro correr, simplesmente porque, assim como Clay, às vezes a inquietude de nossas cabeças – que não reflete nosso jeito calado de ser – é tão grande que não conseguimos ficar parados.

E por fim, um artigo de opinião de Isabela Boscov, sobre reunir os amigos para assistir a filmes – quem também não curte?

Enfim, eu simplesmente amei tudo. A Intrínseca é muito caprichosa com as caixas e todo o seu conteúdo e dá gosto de ser uma assinante do clube! Todo mês fico aguardando ansiosamente pela chegada da nova caixa. No que depender de mim, estarei sempre que possível tentando convencer mais pessoas a adotarem um clube de assinaturas também!


Informações adicionais sobre o livro:

Capa dura: 528 páginas

Editora: Intrínseca, 2018 (inédito – edição especial para Intrínsecos)

ISBN: 9788551003985

Título Original: Bridge of Clay

10 comentários

  1. Enquanto lia o post, a imaginação foi às nuvens. A história teve começo, meio e fim.
    O anseio pelo retorno, acentuado pela depressao materna, e vários dramas, preencheram a infância.
    Um adulto se forma. Nega-se a si, qdo nega-se pai/mãe ausentes?
    A carência fortalece quando negamos de onde e de quem viemos?

    Alguém narrará nossa trajetoria? Alguém se importa? Alguém ouvirá?
    Alguém refletirá sobre a existência e o quanto é maravilhoso existir?

    No final, nada importa … exceto agradecer, agradecer sempre …
    gratidão pela vida, quem nos gerou, de onde viemos, tudo começa ali …

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  2. Eu li A menina que roubava livros assim que foi lançado. E adorei! Mas depois não acompanhei mais o autor. Achei interessante você comentar sobre seu estilo e as frases curtas. Realmente, às vezes levamos um tempinho para nos acostumarmos ao estilo de um livro. Pessoalmente as frases curtas não me incomodam (até porque eu geralmente escrevo assim!! rs). Também achei a premissa do livro instigante. E a capa é linda!! Aprecio um bom minimalismo 🙂

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    1. É bem diferente em muitos aspectos este livro de “A menina que roubava livros”, embora eu tenha mencionado as semelhanças. Não sei quanto a você, mas eu adorei além da historia, toda a parte artística de “A menina…” (os desenhos pintados sobre as páginas de “Minha Luta”, por exemplo), o que não encontramos em “O Construtor de Pontes”. Neste, o toque artístico é menos visual e mais narrativo mesmo, por isso acho que é importante gostar do estilo ou ao menos tentar se acostumar a ele. E a premissa é cumprida no livro, com certeza!

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  3. Primeira vez que leio uma resenha sua e meus parabéns. Raramente vejo um livro tão bem detalhado, buscando o equilíbrio perfeito entre evitar spoiler e a análise da narrativa, enredo e personagens.
    Obrigada pela resenha!

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