Quando se trata de leitura, acredito que não existe certo e errado, sobretudo na poesia. Não tem jeito certo ou errado de se ler poesia. Até porque, a poesia não está contida apenas no sentir de quem tece o poema, está também no sentir daquele que o recebe. A poesia é intensamente subjetiva.
Gosto de ler poesia de forma descontínua, entre um livro e outro, porque é assim que ela me faz mais sentido. Sinto a poesia melhor dentro de mim quando extrapolo a experiência de leitura, confluindo meus percursos literários para que sempre haja mais alguma coisa ali do que poderia ter encontrado antes.
Então, outras páginas me fizeram companhia durante a trajetória guiada por Suzana Piscitello; e foi enriquecedor, por conta das nuances que surgiram dessa combinação. Não que isoladamente a leitura não teria sido boa; eu diria que foi um aditivo que me conectou ainda mais ao propósito das escolhas temáticas da autora.
O trivial é um tema bastante explorado em “Palavra Passarinha”. É a chuva caindo lá fora, o barquinho feito de papel e o outono chegando.
Sua poesia, em grande parte, transmite calmaria, que reflete ao leitor desde a primeira impressão, pelos tons azulados serenos da capa e o título do livro. Ao percorrer suas páginas, eu vi o trivial, mas também peguei palavras emprestadas de outra leitura concomitante, porque me pareceram perfeitas para a ocasião: “pode haver magia no trivial”. E é assim que os versos de “Palavra Passarinha” me chegaram.
Vi a chuva lá fora, mas vi a tristeza dentro de mim, regando as flores que permiti crescerem nas entranhas de quem se deixa chorar “porque posso”.
Construí um barquinho de papel, mas também o naveguei, seguindo as doces “recomendações para noites estreladas”.
Olhei para o céu e vi a chegada do outono, e senti o tempo passando não apenas em mim, mas também por mim, e me “abismei”, encarando meu reflexo no espelho, que um dia já teve rosto de criança. E se a imagem da criança sumiu, foi na poesia de Suzana que ela também se permitiu voltar, passeando entre “A sílaba das crianças”; a imaginação correndo solta, primeiro num trem, depois pelo céu, e, enfim, num cometa.
Não foi uma leitura. Foi um mergulho. Foi um voo alçado em meio às palavras. Palavras passarinhas.
O livro é dividido em 4 seções, e minhas favoritas foram a primeira, sem título, e a dos “hai-quases”, que, apesar da brincadeira com o nome, são verdadeiros haikais.
Na seção que traz a temática da infância, “A sílaba das crianças”, sinto que poderia ler alguns trechos para o meu filho. Se eu fizer isso, volto para contar a experiência.
Na primeira seção, porém, foi onde a poesia de Suzana encontrou forte eco em mim. Amo poemas que falam da própria poesia, do ofício de escrevê-los e do poeta. Gosto da intensidade e profundidade que se escondem nas coisas mais simples da vida. E quem consegue trazer todo esse potencial à tona é um exímio lavrador de palavras. Onde a luz do sol não alcançá-los (pra tomar emprestado também versos seus) sei que haverá quem os alcance. Uma delas é Suzana Piscitello. Obrigada por sua escrita.
Dados Técnicos do livro:
- Capa comum: 76 páginas
- Autora: Suzana Piscitello
- Editora: Versiprosa (2022)
- ISBN: 978-65-84920-17-0
Exemplar recebido em parceria com a Oasyscultural.