A Casa dos Espíritos – Isabel Allende

Em fevereiro deste ano (2023), eu me tornei membro do Clube Namanita, o clube de leituras da Nádia Tamanaha. Estava sempre me coçando para entrar, mas por ter me tornado mãe, não só tive que ir aos poucos abandonando meu próprio clube de leituras (quem se lembra do Clube do Curinga, que tantas vezes mencionei aqui no blog?) como parecia impensável aderir a mais um grupo de leituras coletivas. Mas se você é recém-mamãe e sempre gostou muito de ler, não se desespere. Tudo volta a entrar nos eixos na hora que tiver que ser, e você vai poder voltar a participar de leituras coletivas e clubes de leitura. Em fevereiro a Nádia anunciou que a leitura do Clube Namanita para o mês de março seria A casa dos Espíritos, de Isabel Allende. Eu, que comprei o livro durante e pandemia e deixei ele pegando pó na estante, vi ali uma ótima oportunidade não apenas de desencalhar o “pequeno calhamaço” como também de finalmente dar um passo adiante no meu retorno nas leituras coletivas. E o retorno foi tão inspirador que em fevereiro mesmo li com outras meninas “Torto Arado”, (já viu a resenha dele aqui? Tá imperdível).

Mas voltemos a falar do livro da Allende…

Sinopse:

“O maior sucesso de Isabel Allende, A casa dos espiritos é um clássico do realismo mágico e da literatura latino-americana. A obra traz à vida uma família cujos laços privados de amor e ódio são mais complexos e duradouros do que as lealdades políticas que os colocam uns contra os outros.”

Minhas impressões da leitura:

Este não foi meu primeiro livro lido da Isabel Allende. Quem me acompanha sabe que ela é uma das minhas autoras preferidas, mas, por mais improvável que pareça, eu não ingressei no fantástico mundo literário de Isabel Allende através de sua obra mais conhecida.

Talvez justamente por já ter lido outros livros da autora, este não veio a se tornar um favorito meu, embora eu consiga dimensionar a importância dele para a literatura, já que foi seu primeiro romance e foi publicado originalmente em 1982, período no qual o Chile se encontrava sob o regime ditatorial de Pinochet. A casa dos espíritos não é o único livro com forte viés político da autora chilena, mas é o primeiro, e embora em momento algum nomeie o país e nem o presidente deposto na história, fica muito claro tratar-se, pelo menos como referência ou inspiração, o ocorrido no Chile, com o Golpe Militar de 1973.

A casa dos espíritos é um livro para quem gosta de dramas familiares, sob protagonismo de mulheres fortes, que se destacam e se fortalecem ao longo de 3 gerações. Por ter um enredo fantástico, característico do realismo mágico, a história é habitada e reabitada pela presença constante de mulheres das gerações passadas, ainda que não mais vivas. Eu simplesmente amo essa aparição de espíritos sob a poderosa condução narrativa de Isabel Allende, porque deixa muito evidente para o leitor como os laços familiares são mais fortes do que imaginamos, e como escolhas e atitudes de um familiar podem causar reflexos indesejáveis lá na frente que irão se voltar também contra a própria pessoa e seus entes mais queridos.

Quem tem um pouco mais de dificuldade de visualizar gerações de famílias, sugiro ir esboçando uma espécie de árvore genealógica, porque os nomes das mulheres são muito parecidos (são sinônimos, na verdade: Clara, Blanca, Alba). Eu tenho essa dificuldade, por isso estou deixando a sugestão. Meu esboço foi apenas mental, mas havia momentos em que eu tinha de realmente fazer uma pausa, ainda que ligeira, para entender qual geração estava interagindo com o patriarca da família, o Sr. Esteban Trueba.

Uma das coisas que me incomodou no livro foram alguns estereótipos usados para descrever personagens de origem indígena e asiática. Sei que em muitos momentos a escolha das palavras é justamente para se adequar à voz do narrador-personagem que está no comando da narrativa, mas foi difícil não me sentir atingida, por eu ser uma pessoa de descendência asiática. Em algumas passagens, fica muito claro que quem está narrando, por exemplo, é o próprio Esteban Trueba, e a voz narrativa se torna mais impetuosa e eivada de preconceitos (sobretudo quanto à ideologia comunista, que ele abomina), mas em outras, achei mais difícil separar da própria autora, o que me causou um certo desconforto e me fez pensar que talvez nem tudo no livro tenha “envelhecido” bem, embora facilmente possamos considerar a obra como um clássico com temas super atuais e ainda hoje muito pertinentes de serem discutidos.

Para quem ficou com uma ideia ainda muito vaga sobre o que se trata a história, eu peço que seja feito apenas o exercício de imaginar uma longa trama, muito bem esmiuçada, por três gerações de mulheres fortes, que irão se casar, ter filhos, se apaixonar ou não, e tudo isso tendo como pano de fundo a efervescência politica num país que está prestes a se dividir frente às ideologias político-partidárias de sua população, e com os choques dessas crenças opostas entre membros de uma mesma família. Ademais, há todo uma energia sobrenatural permeando a história, com presságios e visões que, por mais bem alertados, não são suficientes para conter as paixões e pulsões dos envolvidos.

Esta é uma história também sobre ascensões e decadências, sobre legados e despojos. Sobre fortúnios e maldições, que se fazem representados tanto em bens materiais como a posse de terras, como também da forma mais abstrata possível: delineados em sentimentos de amor, ódio, vida e morte. É uma história de contrastes, rica como só pode ser, a história de muitas gerações que vieram antes de nós e todas as ainda por vir.

Dados Técnicos do Livro: