Torto Arado

No sertão baiano, a família de Bibiana e Belonísia e outras em igual situação trabalham de sol a sol a terra. Dela, retiram uma ínfima parte para si que mal lhes sustenta, enquanto todo o grosso restante é entregue aos senhores donos da Fazenda Água Negra, em gratidão ao direito de poderem trabalhá-la e terem um lugar para construir suas moradas. A condição é que estas não sejam erguidas com nenhuma matéria-prima durável, encarregando-se as chuvas e as intempéries do tempo de torná-las impermanentes.

Já no início da história, o destino mostra sua força aguda, e um terrível evento que aprofundará o vínculo entre as irmãs da forma mais inesperada e dolorosa possível escancara como o passado sempre volta a assombrar.

Torto Arado é um romance que traz à tona nossa maldita herança de escravidão, mas também retrata as muitas formas de resistência dos descendentes de africanos escravizados. Essa resistência se manifesta nas festas de jarê, que transborda ancestralidade na trama, trazendo sabedorias, curas e nascimentos; se manifesta no sentimento de comunidade quilombola; no vínculo afetivo, zeloso e reverente à terra, e, ainda, de forma brilhante, se faz presente numa narrativa que dá voz a todos os silenciados.

Se o passado volta a assombrar, é para reclamar o direito a todas suas reparações, é para mostrar que a terra tem memória de todo sangue derramado sobre ela.

No mais, o título do livro evoca a incongruência e inadequação da ferramenta de trabalho à presteza do labor. É o ser humano que deixa de se ver como instrumento e passa se ver com dignidade, como sujeito de direitos. Lindo demais.

“Eu e Belonísia éramos as mais próximas e, talvez por isso, as que mais se desentendiam. Tínhamos quase a mesma idade. Andávamos juntas pelo terreiro da casa, colhendo flores e barro, catando pedras de diversos formatos para construir nosso fogão, galhos para fazer nosso jirau e nossos instrumentos de trabalho para arar nossas roças de brinquedo, para repetir os gestos que nossos pais e nossos ancestrais nos haviam legado.” pp.22-23

Esta foi uma leitura que fiz em conjunto com mulheres incríveis, e cujo debate enriqueceu a experiência de formas que muitas vezes não dou conta de expressar. A elas, fica meu muito obrigada e o desejo por mais leituras coletivas.

Já leu Torto Arado? Me conta o que achou do livro ou se tem vontade de ler.


Dados Técnicos do Livro:

  • Capa comum: 264 páginas
  • Autor: ‎ Itamar Vieira Junior
  • Editora: ‎Todavia; 1ª edição (7 agosto 2019)
  • ISBN-10: ‎6580309318 – ISBN-13: ‎978-6580309313
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