Finalmente li Coco Mellors

Durante nossa estadia no Canadá, enquanto buscava leituras que eu pudesse fazer pelo Kindle (que era a única forma que estava efetivamente conseguindo ler por lá), Coco Mellors sempre aparecia como sugestão de leitura. E não vamos mentir, a capa da edição me atraía, ainda que com muito menos força do que se fosse uma edição física. O livro, porém, era “Cleopatra and Frankenstein” (Cleópatra e Frankenstein por aqui), e o valor para um livro com uma capa tão linda que nunca poderia estampar minhas prateleiras ou minha mesa de cabeceira me pareceu elevado demais para valer o investimento. Deixei para lá.

De volta ao Brasil, muitos meses depois, como costuma ser com livros e leitores, o destino nos aproximou novamente, mas se “Cleópatra e Frankenstein” não conseguiu me seduzir o suficiente, então talvez “As irmãs Blue” o faria. E então o livro foi o votado para leitura de dezembro (2024) pelo Clube Namanita. Era chegada a hora de conhecer Coco Mellors.

Sinopse:

Eram quatro as irmãs Blue, que se tornaram três. Nicky, a segunda mais nova delas, morre deixando uma sustentação impreenchível e desequilibrando a própria relação entre as demais irmãs que agora têm de enfrentar o luto. Um ano após a perda de Nicky, as irmãs terão de se reencontrar e se entenderem, mas como todo reencontro, às vezes o mais desafiador é redescobrir-se a si mesmo.

As irmãs são, em ordem de nascimento: Avery, Bonnie, Nicky e Lucky. Lado a lado, ninguém nega que são irmãs, ainda que uma seja completamente diferente da outra. É nessa dinâmica de divergências, portanto, que acompanhamos como elas vivem o luto e como tentam encontrar formas de continuar vivendo.


Minhas impressões sobre a leitura:

E afinal, o que achei da escrita de Coco Mellors? Sinceramente, eu gostei, talvez mais do que a maioria das pessoas.

No debate do livro foi muito apontado como um ponto negativo a escrita de Mellors, que parece ter uma necessidade de explicar tudo aos mínimos detalhes ao leitor, como se ele mesmo não pudesse chegar àquela conclusão sozinho ou subentender algo.

Eu sei que isso pode ser bem incômodo mesmo, mas eu juro que não senti ela forçar a barra nesse sentido em momento algum. Tem o fato também de uma das personagens ser trazida e construída para o leitor apenas através das memórias das irmãs, e sendo a narrativa em terceira pessoa durante todo o livro, me pareceu bem aceitável que a narradora fosse, além de onisciente, cautelosa ao descrever às minúcias todos os pensamentos e diálogos ocorridos, como numa compensação da ausência dessa personagem.

A história em si, porém, me foi mais desgastante. Não no sentido de ser enfadonho. Em geral, há um traço autodestrutivo em todas as irmãs Blue, com uma conseguindo talvez torná-lo mais funcional e aceitável, mas ainda assim, inegavelmente presente.

Com essa leitura, eu entendi que não me dou bem com personagens assim. Acontece muito de haver livros que tenham um personagem com essa carga autodestrutiva, enquanto outros dão um nítido contraste e carregam a história para um lado menos sombrio e pesado. Mas em “As irmãs Blue”, como não há muito como escapar dessa atmosfera densa, foi bem desconfortável para mim. E talvez aqui seja um bom momento de apontar que este livro pode conter gatilhos de drogas ilícitas, abuso sexual e suicídio.

Apesar do desconforto, como toda leitura coletiva, eu tive a benesse de poder depois confrontar minhas impressões com a de outras pessoas, e isso tornou o livro muito mais tragável, digamos assim.

É um livro que recomendo? Sim. Livros que retratam o luto são sempre muito interessantes de serem lidos, e cada livro acaba por evidenciar como cada pessoa o vive de uma forma única.

Embora o tema foque muito no luto, eu acabei me prendendo muito a uma personagem que não tem nenhum protagonismo, mas que carrega sua grande parcela de responsabilidade também na trama: a mãe das “meninas”. Até mesmo sua ausência me pareceu um elemento importante na história, porque houvesse ela intervindo em algum momento antes, talvez as irmãs não encontrassem sua própria dinâmica. É só quando parece tarde demais que a figura materna aparece, e isso me parece densificar o título do livro, que quer prestigiar a relação entre as irmãs e não entre mãe e filha(s). Quem tem irmãos ou irmãs talvez também curta ler este livro e identifique-se com a dificuldade que é muitas vezes entendê-los e se sentir compreendido/a por eles/elas também, mas como o vínculo acaba sendo tão forte que não conseguimos senão amá-los.

O livro passou longe aqui de ser favoritado, mas colei muito mais flags do que imaginei que faria. Além disso, sua conclusão me fez bem. Não é o final super feliz e doce que talvez tanta sobrecarga merecesse em compensação, mas obviamente essa nem era a intenção da autora. Não é um final feliz que faz um grande final. É enxergar sua possibilidade, ainda que muito distante e com tropeços inevitáveis.

Mas me diz aí quem leu “Cleópatra e Frankenstein”. Vale a pena?


Dados Técnicos do Livro:
  • Capa comum: ‎400 páginas
  • Autora: ‎Coco Mellors
  • Editora: ‎Astral Cultural (10 junho 2024)
  • ISBN-10: ‎6555665009 – ISBN-13: 978-6555665000

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