Algum tempo atrás, eu tive o prazer de ler “Immigratitude” que consegui adquirir num financiamento coletivo a nível global. A edição reúne contos em formato HQ que trazem histórias de imigrantes (ou de seus descendentes) da Ásia, narrando suas vivências. Claro que, como o título é em inglês, você adivinhou corretamente que são famílias que foram para a América, principalmente. E por América eu quero dizer EUA, mas também Canadá. A edição, aliás, foi impressa no Canadá.
Foi uma experiência bem legal de ler o livro, no auge da pandemia de covid-19 e tudo mais, mas tem o “detalhe” de que, apesar de as histórias sobre imigração, de quem quer que seja e para onde quer que seja, carregarem um sentimento universal de pertencimento e adaptação, são pessoas asiáticas fora do contexto brasileiro, que é o caso da minha família. Como já havia dito no post de “Nihonjin”, eu e meus irmãos já somos a quarta geração aqui no Brasil, e a imigração, claro, vai se distanciando geração após geração. Mas “Vozes Amarelas” vem definitivamente preencher essa lacuna para mim, no sentido de que, se faltava algum tipo de literatura que trabalhasse questões parecidas e no mesmo formato que “Immigratitude” (contos/HQ), mas retratando as vozes amarelas brasileiras, agora não falta mais. O que, obviamente, não quer dizer que novas obras do tipo não sejam mais necessárias ou bem-vindas.
Afinal, ao tempo em que Immigratitude conseguiu reunir 18 artistas amarelos, Vozes Amarelas é obra uníssona, de Monge Han, o qual, em que pese traga histórias lindas e até alheias à de sua família, é o retrato de um único artista, reforçando aquilo que acredito: ainda precisamos de mais destaque e incentivo aos autores descendentes de asiáticos aqui no Brasil. Mas é um começo, certo?
A edição capa dura pela Harper Collins além de belíssima, traz prefácio (zero defeitos) por Ana Hikari. Quem já a acompanha, sabe que, além de uma ótima atriz, ela é uma ativista no que toca à representatividade amarela no Brasil, sempre trazendo conteúdos que se interseccionam com raça, sendo, assim, uma grande crítica da discriminação e preconceito sofridos pelos asiáticos, mas também sempre alertando estes sobre seus papéis no combate à toda forma de racismo e discriminação.
Monge Han também aproveita o formato HQ para contextualizar suas ilustrações. Eu desconhecia o que os três olhos representavam, então foi bem interessante ter esse esclarecimento, que é feito de forma bem divertida e humorada. Essa parte, intitulada “Três olhinhos” contém spoilers, então, quem preferir, pode lê-los posteriormente, mas para mim, não estragaram a experiência da leitura de modo algum.
Ao todo, são 5 contos, meu preferido é Hamoni, que talvez esteja estrategicamente situado ao fim da coletânea. Lágrimas podem verter e embaraçar a leitura. As minhas nem tentei segurar. Gosto de findar um livro assim, com todo peso ao fim caindo de uma vez. É assim que sei que o livro me tocou profundamente. As ilustrações de Monge Han são bem expressivas e preservam em algumas partes o estilo da arte coreana minhwa, sem perder a singularidade com a modernidade trazida por seus traços. A escrita também é muito clara e tem seu próprio peso.
Depois dos contos, tem ainda uma “palhinha” do autor, indicando outras vozes amarelas brasileiras para estarmos acompanhando, e eu gostaria de trazer a minha colaboração aqui também:
Nádia Tamanaha (@namanita). Nipo-brasileira, Nádia é uma produtora de conteúdo voltado principalmente para literatura, mas que conversa também com vários outros temas como família, maternidade, luto, e, claro, representatividade amarela. Ela também tem seu próprio clube de leitura, o Clube Namanita, do qual eu amo fazer parte.
Bruna Tukamoto (@bruna.tukamoto). Também nipo-brasileira, e simplesmente a maior personalidade daqui de Londrina – PR (sim, que orgulho, da minha terrinha!) a abordar temas sobre identidade amarela. Está sempre também trazendo ótimos conteúdos de teor crítico sobre racismo e preconceito contra amarelos, mas também dá ótimas dicas sobre beleza asiática.
Sabrina Kim (@yon_sabrinak). Brasileira-coreana, Sabrina dá dicas de moda, e sempre traz reflexões e críticas super pertinentes sobre racismo e microagressões contra pessoas amarelas. Ela ainda contextualiza exemplificando com situações reais pelas quais sua família passa, tornando-a para mim uma boa referência no tema maternidade, claro, mas sobre parentalidade de filhos amarelos. Acho super interessante as colocações dela, principalmente quando trazem relatos sobre a diferença da identidade entre ela e seu parceiro, já que ele é branco, mas tem agora de pensar também nas questões de racismo e microagressões com relação a seu filho, porque ele é amarelo.
Há inúmeras outras pessoas que sigo e acompanho, mas quis destacar essas três mulheres porque elas não apenas são amarelas como eu, mas porque abordam o tema de forma crítica e diferenciada, sem apagamento e sem medo de serem autênticas com seu público, sim, mas sobretudo com elas mesmas.
E vocês? Tem mais dicas de perfis de pessoas amarelas brasileiras para eu acompanhar?
Dados Técnicos do Livro:
- Capa dura: 160 páginas
- Autor e ilustrações: Monge Han
- Editora: HarperCollins, 1ª edição (15 agosto 2023)
- ISBN-10: 6560050475 – ISBN-13: 978-6560050471