Haroun e o Mar de Histórias

Já faz um bom tempo que eu li esse livro, e sempre quis falar um pouco dele, mas não achava que era um livro que cabia dentro do perfil do público do canal no YouTube do qual participo. Imagine então minha satisfação de poder finalmente partilhar dele aqui, num cantinho em que me sinto mais à vontade!

DSC_0006.JPG

Haroun e o Mar de Histórias foi escrito pelo autor britânico, de origem indiana, Salman Rushdie (1947). Rushdie é um escritor brilhante e cativante, que começou a se dedicar à literatura em 1971. Vencedor de muitos prêmios, tais como o Booker Prize (1981), foi também condenado à pena de morte pelo aiatolá Khomini, em 14 de fevereiro de 1989, pela publicação do livro Versos Satânicos (The Satanic Verses, no original), considerado ofensivo ao profeta Maomé e uma apologia ao abandono da fé islâmica. Assim, Rushdie teve de viver muitos anos sob anonimato e escondido (inclusive, um outro escritor britânico muito conhecido lhe deu abrigo: Ian McEwan – tem o review do livro Enclausurado dele aqui).  Após Versos Satânicos, seu primeiro romance publicado foi nada mais nada menos que Haroun e o Mar de Histórias  (1990), e, embora ele seja um livro infantojuvenil, há uma carga bastante séria por trás dele. Com essa história, Rushdie tenta explicar a seu filho a perda da liberdade de expressão que sofrera.

Está aí um livro que me marcou muito. Pode passar muito tempo, posso esquecer alguns detalhes da história, mas com certeza sempre irei me lembrar de sua beleza, de sua singularidade, e de como ele me tocou. A história é sobre um menino chamado Haroun, cujo pai, Rashid Khalifa, ganhava a vida com seu talento de contar histórias. Tanto que era conhecido como “o xá do blá-blá-blá”. Haroun sempre admirou o pai e não conseguia entender de onde ele tirava tantas histórias. Quando lhe perguntava a respeito, Rashid sempre lhe respondia que bebia a “Água de Histórias”, que vinha do “grande Mar de Histórias”.

Um dia, a mãe de Haroun, Soraya, cansada do fato de Rashid “viver de histórias imaginárias” e não da realidade, foge de casa com o vizinho, Sr. Sengupta, que era o extremo oposto de Rashid: odiava histórias, tinha o “pé no chão” demais e não tinha imaginação alguma. Com a inesperada partida de Soraya, Rashid entra em depressão e perde o talento para contar histórias. Foi como se sua “fonte de imaginação” tivesse secado. Haroun quer ajudar o pai, e acaba embarcando numa verdadeira aventura, na qual descobre que realmente existe um “mar de histórias” de onde nascem todas as histórias.

É claro que a trama é toda fantasiosa e não exatamente a versão dos fatos que culminaram na condenação de Rushdie. Mas é justamente por isso que o considero um escritor brilhante, apesar de, confesso, não ter lido ainda nenhuma outra obra dele a não ser essa (pretendo resolver essa pendência o quanto antes, mas são tantos livros na minha pilha interminável de livros….).

Eu sempre fui da opinião que escrever bem para adultos é mais fácil. Você só precisa que as coisas façam sentido, talvez se utilizar de um vocabulário mais rebuscado, e manter as rédeas da narrativa (que significa manter com uma alguma frequência o interesse do leitor). Já escrever bem para crianças exige um pouco mais que isso. A criança precisa se manter curiosa o tempo todo, precisa de alegorias, e, embora não precise que as coisas façam sentido no mundo real, precisa que as coisas tenham um sentido, um propósito dentro da história, para que ela não se perca com suas próprias indagações e saia do foco da história em si. Rushdie faz isso com muita maestria. E bom, quem conta bem uma história para crianças, certamente está ao mesmo tempo contando bem uma história para adultos. É por isso que esse livro não tem idade para ler. Serve para o adulto, serve para a criança. Nele, Rushdie se utiliza de símbolos simples e compreensíveis para as crianças e, um pouco mais elaborado, mas ainda acessível, dá nome a pessoas e lugares em palavras de origem hidustâni. Lembre-se de que o original foi escrito em inglês! Assim, quando ao final você descobre o significado de tais palavras, o encanto com a história se multiplica e o resultado é de arrepiar a pele. Bom, pelo menos foi o que aconteceu comigo. Ainda, os personagens principais são carismáticos, a história tem um enredo cronológico (bastante assimilável para as crianças), que começa com o clássico “era uma vez”, e o texto é enxuto na medida certa: sem muitas distrações mas com a riqueza necessária de detalhes que tornam a narrativa leve, divertida e empolgante.

Haroun e o Mar de Histórias é um livro que deve ser lido por todos. Publicado pela Companhia das Letras (selo Companhia de Bolso), é super rápido de se ler; com apenas 178 páginas, vai fazer você devorar o livro num instante. E, embora curtinho assim, é daqueles livros que vão ficar para sempre com você, que vão sempre estar presentes nas suas memórias, principalmente quando você estiver com aquela sensação de que sua “fonte” seja de inspiração, seja de motivação, também está secando.

Além disso, esse é um livro sobre amor, sobre a importância da família, dos amigos, e da busca e manutenção de nossos ideais. Afinal, quão longe você iria para salvar aqueles a quem você ama?

1 comentário

Deixe um comentário