Livro que deu origem à adaptação pelo Studio Ghibli, “Entregas expressas da Kiki” conta as aventuras de uma jovem bruxa, que, conforme a tradição, sai de casa aos 13 anos para se instalar numa cidade desconhecida e lá conquistar sua independência.
Abrindo uma enorme aspas
Este foi um livro que escolhi ler para o Halloween, mas sem entrar no clima de terror/suspense, que por aqui não tá rolando desde que Naoki chegou. Ficar tensa por causa de enredos do gênero não tem contribuído em nada em termos de entretenimento pra mim, por ora, além de piorarem a ansiedade que já vivencio no dia a dia sendo mãe às vezes solo. Enfim, escolhi este porque tem tudo a ver também, ao trazer a história de uma bruxinha, que não tem absolutamente nada das falsas representações de bruxas como mulheres velhas, malignas, etc., e que também acaba sendo uma forma muito legal de lembrar do que foram as Inquisições e da injusta perseguição às mulheres, e não sair alimentado brasas a nova fogueiras que têm surgido agora, em pleno século XXI (minha gente!) ao se condenar as festas de Halloween como tem acontecido por aqui (Morgana Secco que o diga. Quem não quiser passar raiva, não leia os comentários às fotos dela). O Halloween na escola do(s) seu(s) filho(s) também foi cancelado? Um absurdo, sinceramente.
Ah, e só para deixar claro, o livro não fala nada de Inquisição ou coisa do tipo, é apenas uma história que retrata de forma muito fofa uma tradição fictícia das bruxas, com o protagonismo de uma menina doce e inocente, tá?
Eu nem sei porque estou falando tudo isso, mas ultimamente, parece que estamos precisando dizer além do óbvio.
Retomando minhas impressões…
A mãe de Kiki, quando tinha a mesma idade da filha, fixou morada num pequeno vilarejo, onde ajuda a comunidade com seu remédio para espirro, à base de plantas. Essa poção é uma das magias que ela domina. Mas Kiki só domina uma: voar de vassoura. Mesmo assim, ela se decide a deixar sua casa, confiante de que irá desenvolver sua independência, mesmo numa cidade grande como Koriko.
Chegando lá, as pessoas não parecem muito receptivas a uma bruxa, exceto a dona de uma padaria, que concorda com a sugestão de Kiki em ajudá-la ao lhe prestar um favor. É assim que as entregas de Kiki começam e vão ganhando boa fama na cidade.
Cada capítulo é uma aventura da garota ao longo do seu primeiro ano fora de casa. Sua coragem e bondade dão o tom à história, que nos faz terminar a leitura contagiados com o calor do coração enorme de Kiki.
Eu já havia visto a animação, e acabei revendo-a após a leitura. Percebi que a adaptação dá ênfase ao sentimento de insegurança e coragem de Kiki, adaptando a história então para que o clímax seja justamente a retomada de sua autoconfiança. Ambas as versões são, portanto, muito boas, mas no livro Kiki tem uma insegurança menor, e o livro foca nos pequenos serviços que Kiki realiza na comunidade, e como sua inteligência e disposição vão fazendo com que as pessoas deixem de ter o receio de abrigar uma bruxa na cidade. Ou seja, fala mais de sua aceitação, de pertencimento. Tem até um capítulo em que a dona da padria, sra. Osono, diz que para que Kiki participe de uma tradição de reveillón, ela não pode voar em sua vassoura e Kiki com isso entende que às vezes é gostoso simplesmente poder usar seus pés no chão como todo mundo para grandes deslocamentos.
Porém, ter lido o livro me fez entender mais sobre a obra, inclusive sob a perspectiva dos pais de Kiki, que ficaram aguardando seu retorno à casa depois de 1 ano. É muita ansiedade e saudade, mas acho que o orgulho foi maior ainda. Eu gostei muito que no livro ela chega a voltar para casa para uma breve estadia, porque no livro, a mãe de Kiki é seu porto seguro. Isso não fica evidente na animação, e, como mãe, não poderia ter me emocionado mais.
Uma história leve, divertida, cativante e muito bem-vinda para quem ainda está procurando alguma leitura para terminar o ano com mais esperanças, com menos tensão e com um olhar para o futuro.
Curiosidades:
A autora Eiko Kadono é nascida no Japão (1935), mas chegou a morar por 2 anos no Brasil. Autora de muitos livros, escreveu um inclusive inspirado em sua experiência aqui no nosso país (O Brasil e meu amigo Luizinho – sem tradução).
A tradutora Lúcia Hiratsuka é autora premiada de livros infantis, publicados pelo selo Pequena Zahar. Alguns deles, inclusive, ainda quero muito ler com Naoki, como “Chão de Peixes”.
A edição da Estação Liberdade está lindíssima, e conta com ilustrações de Daniel Kondo, artista gráfico também premiado, tem uma extensa bagagem de parceria com diversos autores. Se tem uma coisa que não falta nesta edição é a representatividade de autores e artistas amarelos. Muito obrigada, Estação Liberdade, por terem trazido este título, com tanto capricho e carinho. Fico muito feliz que meu filho vai poder crescer com muitas oportunidades de leitura em que se verá de alguma forma representado. Vai saber que há autores incríveis que, como ele, são amarelos.
Dados Técnicos do Livro:
- Capa comum: 236 páginas
- Autora: Eiko Kadono
- Editora: Estação Liberdade; 1ª edição (8 novembro 2021)
- ISBN-10 : 6586068223 – ISBN-13 : 978-6586068221
- Título Original: 魔女の宅急便 (Romaji: Majo no takkyubin)
- Tradução: Lúcia Hiratsuka
- Ilustrações: Daniel Kondo