Antônio divorciou-se de Marta, e, em busca de mudanças de ares e um novo ofício, decide ir embora do Brasil para a Dinamarca.
Em Copenhague, ele conhece Hans, um artista que pinta e expõe à venda seus quadros em um estúdio.
Antônio é arquiteto, mas, levado pela solidão e curiosidade, um dia toma coragem e adentra o estúdio de Hans. Com o tempo, vai se formando uma amizade entre ambos, cujo vínculo se apoia na arte, numa relação que começa como mestre e aprendiz, mas depois, como iguais. Hans não é uma pessoa de muitas palavras; mas a arte tem esse poder, de dizer muitas coisas mesmo sem precisar de fato dizê-las. Ao passar suas técnicas e conhecimentos a Antônio, um acaba por ir preenchendo a solidão do outro.
A história é narrada de forma polifônica, ora através das cartas de Antônio endereçadas à sua ex-mulher, Marta, ora em terceira pessoa, mas também em forma de versos. É a partir dessas diversas formatações (para usar de uma metáfora artística) que se compõe todo o quadro final. E o resultado é uma verdadeira obra-prima.
Essa é uma história com um protagonismo e personagens mais velhos (o que eu amo), e surpreende como a autora, tão jovem, tenha conseguido trazer, em diversas cenas, e com uma enorme sensibilidade, tamanha exatidão de uma fase ainda não vivida por ela.
Trouxe o livro para terminar de lê-lo na casa dos meus sogros, e me arrependi de não ter trazido minhas flags e post-its para sair colando em todas as inúmeras belíssimas passagens desse livro. As melhores, para mim, são expressas nas cartas de Antônio. Quem ama narrativa epistolar vai se apaixonar pelo livro.
O que acho mais curioso no livro, porém, é a beleza e delicadeza de como tudo é dito (ou não dito; algumas coisas ficam só nas entrelinhas, talvez para o imaginário do leitor). Gosto de como a solidão é mostrada, principalmente após a meia-idade, e de como nem sempre é uma companhia romântica que a afasta, mas como é óbvio que a ausência de somente uma única pessoa pode transformar tudo em um completo vazio.
Bakken, para quem não sabe (eu não sabia), é um parque de diversões na capital dinamarquesa. É considerado o primeiro parque de diversões do mundo. Claro que fui pesquisar sobre o lugar, e, incrivelmente, me senti transportada para aquele lugar, junto a Hans e Antônio. Todas as fotos do lugar me trouxeram uma mistura de conforto, bucolismo, mas também tristeza, que combina muito com a sensação que o livro me passou também. A serenidade de poder ir a tal lugar sem a pressão de se aventurar pelos brinquedos que, quando criança, Antônio simplesmente odiaria, oferece um alento indescritível que, de alguma forma, acaba por traduzir o sentimento de mutualidade inerente às amizades.
É um livro para jovens leitores enxergarem que a solidão talvez seja uma constante da vida, mas também para que consigam ver que a beleza dela está justamente nas incertezas. Para leitores mais maduros, em termos de idade, acredito ser uma linda narrativa para se repensar toda a trajetória já percorrida, entender que todos nós somos solitários em algumas fases da vida, mas que mudanças são possíveis a qualquer momento, não importa a idade. Às vezes é só a coragem de mudar que nos trará uma nova companhia. Às vezes é preciso recomeçar em outro lugar, para descobrir-se menos só.
Dados Técnicos do Livro:
- Capa comum: 184 páginas
- Autora: Julia Barandier
- Editora: Editora 7Letras (1ª edição, novembro de 2022)
- ISBN: 978-6559055203
Edição recebida em parceria com a Oasys Cultural. Adquira a sua preferencialmente pelo site da editora.