Sinopse:
“Julia é filha de pais separados: sua mãe não suporta a ideia de ter sido abandonada pelo marido, enquanto seu pai não suporta a ideia de ter sido casado. Sufocada por uma atmosfera de brigas constantes e falta de afeto, a jovem escritora tenta reconhecer sua individualidade e dar sentido à sua história, tentando se desvencilhar dos traumas familiares.
“Entre lembranças da infância e da adolescência, e sonhos para o futuro, Julia encontra personagens essenciais para enfrentar a solidão ao mesmo tempo que ensaia sua própria coreografia, numa sequência de movimentos de aproximação e afastamento de seus pais que lhe traz marcas indeléveis.
“Escrito com a prosa original que fez de Aline Bei uma das grandes revelações da literatura brasileira contemporânea, Pequena coreografia do adeus é um romance emocionante que mostra como nossas relações moldam quem somos.”
Para quem já lei O Peso do Pássaro Morto, a forma escolhida por Aline Bei para a narrativa do romance Pequena coreografia do adeus, em versos, com dinamismo de tamanho de fontes diferentes e repetição de palavras, não é um elemento que cause estranheza, embora não deixe de ser tão impactante quanto o primeiro. Assim, não é para menos que tenho a convicção de dizer que amei ainda mais este segundo livro.
Júlia é uma menina que tem uma mãe autoritária e um pai indulgente, e toda a narrativa parte de sua própria perspectiva; primeiro, do ponto de vista da criança que ela era, descrevendo tudo o que sentia, numa análise que capta toda a dor, medo, tristeza e mágoa que ela carregou quando pequena, e depois, já adulta, contando os fatos já com um senso bastante crítico. É extremamente doloroso ver o grau de sua inocência de criança e acompanhar seu desenvolvimento, que, mesmo adulta, ainda carece de afeto, porque Júlia tornou-se uma mulher que cresceu com muito pouco dele.
Ainda assim, como ela mesma diz, mas talvez com outras palavras, ela não cresceu com a raiva dentro de si. Claro que, tentando alcançar os parâmetros inalcançáveis de “boa filha” aos olhos de sua mãe, houve episódios de raiva e até algumas brigas na escola, porque uma hora toda violência que uma pessoa recebe, tem que escorrer para fora dela para não permanecer armazenada. Mas foi essa resiliência que permitiu a Júlia crescer como uma moça calma e apaixonada por livros e histórias, onde ela deve ter se abrigado muitas vezes em sua solidão.
Falando em solidão, um dos trechos do livro que mais me marcou foi justamente quando Júlia fala sobre a solidão dela e de seus pais:
“nosso jeito de conversar, diretora, é nos machucando/não por mal, não somos maus/somos tristes e isso é o que fazemos com a nossa solidão.” pp. 108-109
A história de Júlia, para mim, parece cíclica, se analisada num grande quadro. Ela consegue transpor inúmeras dificuldades, e torcemos o tempo todo pelo seu sucesso. Mas quando tudo parece superado, algo do passado sempre volta para assombrá-la, tendo seu ápice, ao final do livro, o que me gerou uma insônia muito grande, porque passei horas pensando sobre o ocorrido.
Assim como seu romance de estreia, este não é um livro leve, que pode ter gatilhos para violência e maus-tratos infantis, mas a escrita de Aline Bei, pela boca de sua protagonista Júlia, torna tudo não apenas suportável, mas acolhedor de tantas dores que existem pelas casas desse mundo que nos os tornam lares, fazendo-nos ainda refletir que, não importa de onde viemos, somos também resultado dos afetos que recebemos (ou não).
Dados Técnicos do Livro:
- Capa comum: 264 páginas
- Autora: Aline Bei
- Editora: Companhia das Letras; 1ª edição (26 abril 2021)
- ISBN-10: 6559210413 – ISBN-13 : 978-6559210411