Sinopse:
“Neste livro, Paul Theroux passa um fim de tarde na casa de Jorge Luis Borges em Buenos Aires e na China pega um voo que parece mais esporte radical do que uma viagem. Descreve um banquete exótico de pratos elaborados com animais em extinção, e explora a América Latina da fronteira sul do Texas à extremidade da Patagônia – fazendo uma pausa em El Salvador para uma violenta partida de futebol. Em 1988, Theroux atravessa a China na precária ferrovia “Galo de Ferro” com um inconveniente acompanhante governamental. Em uma estação ferroviária de Paris, o autor em-barca no Expresso do Oriente, cuja rota vai até Istambul; depois passa uma gélida noite de Natal no Expresso Transiberiano. Pelas janelas de outro trem conhece um Vietnã ainda em guerra onde crianças brincam sem o olhar protetor de adultos, porque nenhum sobreviveu. Viajar, pelas palavras dele, com sua visão penetrante e um estilo impecável, é uma experiência que transcende qualquer turismo tradicional.”
Conheci o nome do autor, Paul Theroux, num livro de fotografias de Steve McCurry, “On Reading”, cuja introdução é justamente desse escritor de livros de viagem.
Não é a primeira vez que leio um livro de viagem, mas “Até o Fim do Mundo” é realmente diferente de outros livros que já li; talvez porque todos os textos foram escritos pela mesma pessoa (ao contrário por exemplo de “Footsteps”) e porque reúna impressões sobre vários povos e lugares do mundo.
O livro é dividido em 6 partes, com capítulos cujos títulos, acredito, se referem ao nome dos livros de onde o autor extraiu os textos por ele selecionados: O grande bazar ferroviário, O velho expresso da Patagônia, O reino à beira-mar, Viajando no galo de ferro, Descendo o Yang-tsé e Alvorada com monstros marinhos. Meus favoritos foram O velho expresso da Patagônia e Viajando no galo de ferro, embora eu tenha realmente gostado muito do primeiro texto que abre o livro, intitulado “O misterioso sr. Duffill”.
De um modo geral, os textos de Theroux são muito bem humorados, mas o humor é uma coisa curiosa, que talvez Terry Eagleton tenha conseguido falar um pouco a respeito em seu livro (resenha aqui). Nem sempre as coisas que dizemos são engraçadas para todo mundo, e há certas coisas que, pior, podem ser bastante ofensivas. E foi talvez com um certo choque que eu me deparei com algo nas inúmeras anedotas de Theroux que me incomodaram. Lembro-me de ter comentado com meu marido: “parece que ele é um autor americano escrevendo só para os americanos”. Não sei se eu havia imaginado uma escrita sob um olhar cosmopolita ou impressões romantizadas sobre suas viagens, mas ao longo da leitura comecei a questionar se seria realmente possível escrever sobre um determinado povo e lugar do qual não fazemos parte e não colocarmos nosso próprio olhar sobre eles, e se seria preconceito pura e simplesmente fazer suposições — ainda que equivocadas — ou mesmo formarmos uma impressão pessoal generalizada sobre tal realidade. Ao concluir que não seria possível, minha postura diante do livro foi mudando, mesmo ainda me parecendo um pouco preconceituosas certas opiniões formadas.
Por outro lado, é preciso lembrar que essas viagens ocorreram entre as décadas de 1980 e 1990, e talvez o próprio Theroux, já tendo viajado muito mais e até morado em outros países, pode ter mudado suas impressões ou se deparado com outras situações que as ratificaram. Difícil saber sem contrastar com textos mais atuais.
Quanto à expectativa que eu pudesse ter de impressões romantizadas, vejo que foi uma ingenuidade minha. Theroux ama viajar, não há dúvida quanto a isso. Seus melhores trechos no livro, inclusive, são aqueles em que ele discorre justamente sobre o que é o ato de viajar; mas isso não significa que toda experiência de um lugar será positiva ou apaixonante. Eu mesma já me frustrei em inúmeras viagens. E nada melhor que um autor de livros de viagem escrever com sinceridade seus sentimentos sobre os lugares que visitou e pessoas que conheceu. Não espere portanto, deste livro, relatos maravilhosos sobre paisagens exuberantes e pessoas animadas e calorosas, muito menos uma espécie de guia de viagem. Para ele “quando alguma experiência humana é registrada, surge um bom texto sobre viagens”. E é basicamente essa a abordagem do livro: inúmeros registros de experiências que o autor teve, sobretudo em contato com uma pessoa em particular em determinado momento e determinado ponto do mundo.
“Viajar é desaparecer, uma incursão solitária até o esquecimento através de uma estreita faixa geográfica.” (p. 115)
“”Todos os viajantes são otimistas”, pensei. A viagem é uma espécie de otimismo em ação. Eu sempre partia pensando: “Vou estar bem, vou me interessar por alguma coisa, vou descobrir alguma coisa, não vou quebrar uma perna nem ser roubado, no final do dia vou encontrar um bom lugar para dormir. Vai ser tudo ótimo. Mesmo que não seja, alguma coisa vai ser digna de nota — vai fazer a viagem valer a pena””. (p. 210)
O que mais gostei no livro, porém — além dos trechos sobre o ato de viajar —, foram as referências literárias e até várias informações a que tive acesso com esta leitura, principalmente em “Viajando no galo de ferro”, no qual tudo me pareceu muito curioso.
Quem gosta de se imaginar viajando solitariamente pelo mundo talvez goste dessa leitura, já que ela evoca uma conexão entre o viajante e o lugar, mas sem se distanciar jamais do contato propriamente humano. Parece-me que as viagens de Theroux são guiadas pela curiosidade genuína que ele tem sobre as pessoas que encontra em seu caminho, e como elas ajudam a imprimir nele parte da paisagem local.
O livro não era tudo aquilo que eu esperava, mas certamente me trouxe bom entretenimento e me ensinou muito, inclusive a desfrutar mais das minhas futuras viagens, pensando o que a fez valer a pena, o que foi digno de nota.
Dados Técnicos do Livro:
Capa comum: 424 páginas
Autor: Paul Theroux
Editora: Objetiva; Edição: 1 (6 de maio de 2010)
ISBN-10: 8539000539 – ISBN-13: 978-8539000531
Edição adquirida na Livraria Martins Fontes – São Paulo. Adquira o seu preferencialmente em uma livraria também. Apoie livrarias, apoie livrarias independentes.
Adoro viajar, particularmente de carro ou moto. Não sou fã da qualidade de turista. Prefiro a qualidade de viajante, apesar dos contratempos que possam surgir. A sensação de interação, participação e conquista dos lugares percorridos parece maior.
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Às vezes uma leitura não consegue nos cativar tanto, mas vale a pena a experiência. ♥
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Exatamente, Gio. E como ela foi melhorando ao longo da leitura, valeu a pena não ter desistido 🙂
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